O juiz Sérgio Moro, responsável pelos processos da Operação Lava Jato
na primeira instância, condenou o ex-presidente Luiz Inácio Lula da
Silva (PT) no processo que envolve o caso da compra e reforma de um
apartamento triplex em Guarujá, no litoral de São Paulo. Ele foi condenado a
nove anos e seis meses pelos crimes de corrupção passiva e lavagem de dinheiro.
É a primeira vez, desde a Constituição de 1988, que um
ex-presidente é condenado criminalmente. A sentença foi publicada nesta
quarta-feira (12) e não determina a prisão imediata de Lula. Na decisão, Moro
permite que petista recorra em liberdade.
"[...] Considerando que a prisão cautelar de um
ex-Presidente da República não deixa de envolver certos traumas, a prudência
recomenda que se aguarde o julgamento pela Corte de Apelação antes de se
extrair as consequências próprias da condenação. Assim, poderá o ex-Presidente
apresentar a sua apelação em liberdade", diz a decisão. Veja a íntegra
da decisão de Sérgio Moro.
Por "falta de prova suficiente da materialidade",
o juiz absolveu Lula das acusações de corrupção e lavagem de dinheiro
envolvendo o armazenamento do acervo presidencial numa transportadora, que
teria sido pago pela empresa OAS.
"Por fim, registre-se que a presente condenação não
traz a este julgador qualquer satisfação pessoal, pelo contrário. É de todo
lamentável que um ex-Presidente da República seja condenado criminalmente, mas
a causa disso são os crimes por ele praticados e a culpa não é da regular
aplicação da lei. Prevalece, enfim, o ditado "não importa o quão alto você
esteja, a lei ainda está acima de você (uma adaptação livre de 'be you never so
high the law is above you')", escreveu Moro na sentença.
Moro também aplicou a Lula uma multa. "Considerando a
dimensão dos crimes e especialmente renda declarada de Luiz Inácio Lula da
Silva (cerva de R$ 952.814,00 em lucros e dividendos recebidos da LILS
Palestras só no ano de 2016), fixo o dia multa em cinco salários mínimos
vigentes ao tempo do último ato criminoso que fixo em 12/2014".
Sentença
No processo, Moro condenou Lula com base na denúncia do
Ministério Público Federal (MPF) de que o ex-presidente teria recebido da OAS o
triplex reformado no Condomínio Solaris, em Guarujá, como propina dissimulada
em troca de contratos da Petrobras com a empreiteira.
De acordo com Sérgio Moro, a lavagem de dinheiro faz parte
de um contexto mais amplo de "um esquema de corrupção sistêmica na
Petrobras". "Agiu [Lula], portanto, com culpabilidade extremada, o
que também deve ser valorado negativamente", afirmou o juiz federal na
sentença.
Antes de a OAS assumir a obra, o edifício era comercializado
pela antiga cooperativa de crédito do Sindicato dos Bancários de São Paulo,
conhecida como Bancoop, que faliu. A ex-primeira-dama Marisa Letícia tinha uma
cota do empreendimento.
O imóvel, segundo o MPF, rendeu um montante de R$ 2,76
milhões ao ex-presidente. O valor é a diferença do que a família de Lula já
havia pagado pelo apartamento, somado a benfeitorias realizadas nele.
Parte da denúncia é sustentada com base em visitas que Lula
e Marisa Letícia fizeram ao apartamento, entre 2013 e 2014. Segundo
procuradores, a família definiu as obras a serem feitas no imóvel, como a
instalação de um elevador privativo.
Ao longo do processo, a defesa de Lula reconheceu que Marisa
Letícia tinha uma cota para comprar um apartamento, mas diz que ela desistiu da
compra quando a Bancoop faliu e a OAS assumiu o empreendimento. Os advogados
afirmam que o apartamento 164 A está em nome da OAS, mas, desde 2010, quem
detém 100% dos direitos econômico-financeiros sobre o imóvel é um fundo gerido
pela Caixa Econômica Federal.
Sobre as visitas de Lula e Marisa ao apartamento, a defesa
alega que eles queriam conhecer o imóvel e planejar uma possível compra.
Afirmam, porém, que, mesmo com as benfeitorias realizadas pela construtora, a
compra não foi realizada.
Armazenamento de bens
O que diz o MPF: A OAS pagou R$ 1.313.747,24 para a empresa
Granero guardar itens que Lula recebeu durante o exercício da presidência,
entre 2002 e 2010. O pedido foi feito pelo presidente do Instituto Lula, Paulo
Okamotto, e pelo próprio ex-presidente da República.
O que diz a defesa: Os itens sob a guarda da Granero não
eram bens de uso pessoal do ex-presidente, mas faziam parte do acervo
presidencial, que lhe foi concedido pela Secretaria-Geral da Presidência da
República, assim que ele deixou o mandato. Segundo o Instituto Lula, a maior
parte dos materiais são cartas, camisetas e peças de artesanato.
Conforme Paulo Okamotto, o ex-presidente da OAS Léo Pinheiro
se ofereceu para ajudar temporariamente o Instituto Lula a armazenar os objetos
em um espaço que a empresa já alugava na Granero. Okamotto nega qualquer
irregularidade no apoio dado pela OAS.
Nomeações na Petrobras
O que diz o MPF: Quando era presidente, Lula usou seu poder
para manter na Petrobras os ex-executivos Paulo Roberto Costa, Pedro Barusco e
Renato Duque – já condenados na Lava Jato por atuar em favor de um cartel que
fraudava contratos na Petrobras. O MPF defende que a manutenção deles nos
cargos favoreceu o consórcio liderado pela OAS.
O que diz a defesa: Todas as nomeações para as diretorias da
Petrobras foram feitas a partir de indicações de aliados políticos. Lula apenas
assinou as ordens para que as pessoas assumissem os respectivos cargos.
Benefícios para a OAS
O que diz o MPF: Consórcios dos quais a OAS fazia parte
conseguiram contratos para obras na Refinaria Presidente Getúlio Vargas
(Repar), em Araucária, na Região Metropolitana de Curitiba, e na Refinaria
Abreu e Lima (Rnest), em Pernambuco.
Na Repar, antes da licitação, a Petrobras fez um orçamento
para a obra e estimou que gastaria até R$ 1,4 bilhão. No entanto, a estatal
acabou fechando contrato no valor de R$ 2,079 bilhões, quase 50% a mais do
esperado. Outros dois contratos com sobrepreço ocorreram na Rnest. Juntos,
custaram cerca de R$ 4,4 bilhões.
O que diz a defesa: Lula não atuou em favor de cartel na
Petrobras, e não há evidências que suportem a denúncia. O foco de corrupção
alvo da Lava Jato está restrito a alguns agentes públicos e privados, que
atuavam de forma independente, regidos pela dinâmica de seus próprios
interesses, e alheios à Presidência da República.
Todos os réus do processo
Além de Lula, outras seis pessoas foram envolvidas nesta
ação penal. Veja abaixo as acusações contra cada réu.
•Luiz Inácio Lula da Silva, ex-presidente: corrupção passiva
e lavagem de dinheiro
•Léo Pinheiro, ex-presidente da OAS: corrupção ativa e
lavagem de dinheiro
•Paulo Gordilho, arquiteto e ex-executivo da OAS: lavagem de
dinheiro
•Paulo Okamotto, presidente do Instituto Lula: lavagem de
dinheiro
•Agenor Franklin Magalhães Medeiros, ex-executivo da OAS:
corrupção ativa
•Fábio Hori Yonamine, ex-presidente da OAS Investimentos:
lavagem de dinheiro
•Roberto Moreira Ferreira, ligado à OAS: lavagem de dinheiro
Outros processos de Lula
O ex-presidente é réu em outras duas ações da Lava Jato, em
uma ligada à Operação Janus, que trata de contratos no BNDES, e outra
relacionada à Operação Zelotes, que apura venda de medidas provisórias.
Lula também foi denunciado no caso envolvendo o sítio em
Atibaia, no interior de São Paulo, no âmbito da Lava Jato.
Ele é alvo ainda de dois inquéritos na Lava Jato: um sobre a
formação de organização criminosa para fraudar a Petrobras, e outro sobre
obstrução das investigações ao tomar posse como ministro de Dilma. Na Zelotes,
ele é investigado em inquérito sobre a edição da medida provisória 471, que
criou o Refis. Reproduzido do Folha do Pará Online.
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