Para juiz federal de Niterói, nomeação da parlamentar, condenada por infringir legislação trabalhista, por Temer é 'flagrante desrespeito à Constituição’
A deputada Cristiane Brasil (PTB-RJ), que teve sua nomeação como ministra suspensa pela justiça (Ananda Borges/Câmara dos Deputados)
O juiz
federal Leonardo da Costa Couceiro, da 4ª Vara Federal de Niterói (RJ),
suspendeu nesta segunda-feira a nomeação da deputada Cristiane Brasil (PTB-RJ) como nova ministra do
Trabalho do governo Michel Temer (PMDB) –
a cerimônia de posse estava prevista para as 15h desta terça-feira, 9, e já foi
desmarcada pelo Palácio do Planalto, que informou que irá recorrer da decisão.
Segundo o
magistrado, a escolha da parlamentar para o cargo desrespeita a moralidade
administrativa, porque ele já foi condenada pela Justiça trabalhista. Ele
estabeleceu multa de R$ 500 mil a cada agente público que descumprir a decisão.
“No caso concreto, conceder a liminar sem ouvir os réus encontra-se justificado
diante da gravidade dos fatos sob análise. Em exame ainda que perfunctório,
este magistrado vislumbra fragrante desrespeito à Constituição Federal no que
se refere à moralidade administrativa, em seu artigo 37, caput, quando se
pretende nomear para um cargo de tamanha magnitude, ministro do Trabalho,
pessoa que já teria sido condenada em reclamações trabalhistas, condenações
estas com trânsito em julgado, segundo os veículos de mídia nacionais e
conforme documentação que consta da inicial”, escreveu Couceiro.
O
magistrado acatou pedido de liminar em uma das seis ações populares
protocoladas na Justiça Federal do Rio pelo grupo Movimento dos Advogados
Trabalhistas Independentes. Duas delas foram indeferidas por juízas de Magé e
da capital fluminense. Elas entenderam que não há ilegalidade na nomeação da
parlamentar e disseram que impedir a posse seria uma ingerência do poder
Judiciário no Executivo.
Contra
este argumento, Couceiro afirmou: “É bem sabido que não compete ao Poder
Judiciário o exame do mérito administrativo em respeito ao princípio da
separação dos poderes. Este mandamento, no entanto, não é absoluto em seu
conteúdo e deverá o juiz agir sempre que a conduta praticada for ilegal, mais grave
ainda, inconstitucional, em se tratando de lesão a preceito constitucional
autoaplicável. Vale ressaltar que a medida ora almejada é meramente cautelar,
precária e reversível, e, caso seja revista, somente haverá um adiamento de
posse. Trata-se de sacrifício de bem jurídico proporcional ao resguardo da
moralidade administrativa, valor tão caro à coletividade e que não deve ficar
sem o pronto amparo da tutela jurisdicional.”
Cristiane
Brasil é deputada federal pelo PTB do Rio de Janeiro e filha do ex-deputado Roberto Jefferson,
condenado no mensalão. Presidente nacional do partido, foi ele quem articulou
pessoalmente a nomeação de Cristiane por Temer.
O
processo
Cristiane
Brasil foi condenada na Justiça Trabalhista do Rio por não
assinar a carteira de trabalho de um motorista que
lhe prestou serviços ao longo de quatro anos. A violação a seus direitos
trabalhistas levou Fernando Fernandes Dias a processar a deputada e a
vencer a ação judicial tanto na 44ª Vara do Trabalho do Rio, em primeira
instância, em abril de 2016, quanto na 10ª Turma do Tribunal Regional do
Trabalho da Primeira Região (TRT1), em segunda instância, em fevereiro de 2017.
Na
decisão de primeira instância, o juiz Pedro Figueiredo Waib afirma que as
jornadas diárias do motorista duravam 15 horas e meia, das 6h30 às 22h, de
segunda a sexta-feira, e que o salário dele era de 4.000 reais. Waib
reconheceu vínculo empregatício entre Cristiane e Fernando Dias entre novembro
de 2011 e janeiro de 2015, período em que a ministra era vereadora no Rio. O
magistrado determinou, assim, que ela assinasse a carteira de trabalho do
funcionário e pagasse a ele direitos como férias, gratificações natalinas e
aviso prévio.
Após
acórdão do TRT1, o valor da condenação foi fixado em 60.476 reais, valor
homologado em 31 julho do ano passado pela juíza do trabalho Anna Elisabeth
Junqueira Ayres Manso Cabral. Do montante, foram depositados 8.183 reais a
partir de penhoras. Embora a juíza tenha estipulado um prazo de 15
dias para o pagamento dos 52.293 reais restantes, ela assinalou em 16 de
outubro de 2017 que a ministra ainda não havia comprovado que quitou a dívida
trabalhista. O nome de Cristiane Brasil, no entanto, não consta no Banco Nacional
de Devedores Trabalhistas do Tribunal Superior do Trabalho (TST).
No processo, a
Cristiane alegou que Fernando Dias era “autônomo”, “exercia tão somente
trabalho eventual”, “nunca esteve sob a sua dependência ou à disposição” e “não
era e nem nunca foi seu empregado”. “[Dias] era eventualmente convidado a
prestar serviço de motorista para os seus filhos, uma vez que tinha confiança
no trabalho dele, quando o conheceu na época em que estava vinculada à Câmara
dos Vereadores e à Prefeitura do Município do Rio de Janeiro”, sustentou a
defesa da petebista.
Conforme
o relatório do depoimento de Dias no processo, no entanto, ele “trabalhava no
seu dia a dia levando os filhos da reclamada (Cristian e Catarina) para
médicos, escola, psicólogos, baladas etc”. Ao longo de 2011, o motorista diz
ter folgado apenas aos domingos e, entre 2012 e 2014, passado a trabalhar cinco
dias semanais. Dias também relatou que levava empregadas domésticas de
Cristiane Brasil a compras e pagava contas dela. Segundo o motorista, ele
recebia 1.000 reais em espécie e os 3.000 reais demais em conta bancária.Reproduzido de Veja. (Com Estadão Conteúdo)
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