O ministro da Saúde, Arthur Chioro, anuncia medidas para estimular o parto normal |
- André Coelho/Agência O Globo
Com o objetivo inibir o agendamento de cesarianas e, assim, evitar partos antes da hora, o Governo Federal anunciou nesta terça-feira (6) que o preenchimento de um partograma, documento onde são registradas todas as etapas do trabalho de parto da gestante, passa a ser obrigatório para médicos de toda a rede privada do país. Segundo a decisão, anunciada pelo ministro da Saúde, Arthur Chioro, e pela ANS (Agência Nacional de Saúde Suplementar), as operadoras de planos de saúde só podem realizar o pagamento dos procedimentos médicos mediante a apresentação do documento completo.
A adoção do
partograma deve forçar os médicos obstetras a esperar o início do trabalho de
parto. "Parto não é evento que se marque. Normal é o parto normal",
afirmou o ministro. As informações contidas no partograma poderão ser
analisadas por auditorias realizadas pelas operadoras de saúde. "Se a
operadora entender que etapas não foram seguidas, ela poderá glosar o
pagamento. É tudo que a operadora quer", disse o presidente da ANS, André
Longo.
Segundo o ministro,
o preenchimento do partograma deverá seguir padrão estabelecido pela OMS
(Organização Mundial da Saúde), como ocorre em outros países. Em casos de parto
emergencial, quando não há início de trabalho de parto, um relatório médico,
detalhando o ocorrido com a gestante, poderá substituir o partograma sem
prejuízo do pagamento do serviço pela operadora de plano de saúde.
Também passa a ser
direito da gestante o acesso, em até 15 dias, aos porcentuais de parto normal e
cesáreo do médico e do serviço hospitalar que ela pretende utilizar. As
informações podem ajudar a paciente, avalia o ministério, na escolha do
profissional que irá acompanhá-la durante a gestação. As operadoras também
serão obrigadas a prestar informações sobre a média alcançada por sua empresa.
Caso os dados não sejam divulgados, a multa será de R$ 25 mil.
Outras medidas são
a distribuição às gestantes de cartões de acompanhamento, semelhantes aos
ofertados pelo SUS, com informações sobre os riscos do parto cesariano
desnecessário e dados de todo o pré-natal, e o incentivo para que hospitais
privados façam parte da iniciativa Hospital Amigo da Criança e da Mulher, já
existente na rede pública. Com o cartão de acompanhamento, qualquer
profissional de saúde terá conhecimento de como se deu a gestação, facilitando
o atendimento à mulher quando ela entrar em trabalho de parto.
A medida integra um
pacote de resoluções para estimular o parto normal e a redução de cesarianas
desnecessárias entre as consumidoras de planos de saúde. As propostas foram anunciadas em outubro de 2014 e passaram
por consulta pública. O governo pretende combater o que
considera uma epidemia de cesarianas no país, já que a cesariana representa cerca de 80% dos nascimentos via
planos de saúde. Na rede pública, esse percentual está na
faixa de 40%. No Brasil, 55,6% dos partos são cesáreas. A OMS (Organização
Mundial da Saúde) recomenda que este percentual não passe dos 15%.
Segundo o
ministério da Saúde, a cesariana, quando não há indicação médica, aumenta em
120 vezes o risco de problemas respiratórios para o recém-nascido e triplica o
risco de morte da mãe. Ao todo, cerca de 25% dos óbitos neonatais e 16% dos
óbitos infantis no país estão relacionados à prematuridade.
"É necessário
mudar a cultura do parto. Temos que tratar a epidemia de cesarianas que vivemos
como um problema de saúde pública. É um problema que vem se agravando ano a
ano", afirma Chioro.
A resolução normativa
será publicada no Diário Oficial nesta quarta-feira (7) e entrará em vigor em
180 dias.
Poder de escolha da gestante
Anunciado como
medida de estímulo ao parto normal na rede privada, o partograma daria à
gestante maior poder de escolha sobre o parto. No documento, um gráfico
registra o desenvolvimento do parto e mostra dados como a frequência das
contrações e o estado do bebê. O instrumento daria maior segurança para a
decisão sobre o parto entre o médico e a gestante, que estaria melhor orientada
sobre possíveis riscos.
Na visão da ANS e
do ministério da Saúde, a mulher ganha autonomia para decidir entre a
realização do parto normal ou da cesariana (conheça os riscos e benefícios de cada tipo),
evitando-se situações em que a gestante sente-se induzida pelo médico a
realizar a intervenção cirúrgica por falta de informação sobre o que realmente
se passa em seu trabalho de parto.
Consultada
pelo UOL, a obstetriz Ana Cristina Duarte, coordenadora
do Gama (Grupo de Apoio à Maternidade Ativa), diz que o partograma e a
carteira da gestante são as bases para um parto humanizado. No entanto, ela vê
o país ainda longe do ideal. "O parto [no Brasil] é muito
medicalizado", afirma. Para ela, a adaptação às novas normas por
operadoras, hospitais e médicos se dará de forma que não levará à redução da
cesariana.
"Marcando mais
cesarianas, o médico ganha mais. Se o plano recusar pagamento por falta de
partograma, o médico se descredenciará. Sem obstetra credenciado, o plano não
pode funcionar. O hospital precisa preencher leitos e deixar leitos vagos [para
a realização de partos normais] dará prejuízo]. E as mulheres querem ter bebê
com médico particular. O que é preciso é mudar a cultura", diz Ana.
Segundo a obstetra,
o governo precisaria investir mais em campanhas de conscientização sobre os
benefícios do parto normal. "As mulheres precisam aderir, ver que é legal ter
parto normal", completa.
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